Os telefonemas, as cartas. O sentido do Papa pela comunicação.
"Pequenas e grandes escolhas de estilo, novas para um Papa.
Falam de um pastor que por vinte anos foi o bispo no meio do povo, para o
povo e com o povo, fora dos palácios curiais, longe de todo
clericalismo e longe do poder, continuando a ser ele mesmo até o fundo,
também no Vaticano", escreve Andrea Tornielli, jornalista, em artigo publicado no portal Vatican Insider, 12-09-2013. A tradução é de Benno Dischinger.
Eis o artigo.
“P/ excelentíssimo Doutor Scalfari... “O Papa pega a caneta para escrever uma carta de resposta a um jornal. Isso jamais acontecera. O fundador de “Repubblica”, Eugenio Scalfari, se dirigira diretamente a ele por duas vezes, em julho e depois em agosto, com perguntas e reflexões a partir da encíclica “Lumen Fidei”. Francisco
considerou-as inteligentes e respondeu com uma longa carta pessoal
publicada pelo cotidiano, apresentando o coração da fé e da experiência
cristã e explicando que o diálogo com os não crentes “não é um acessório
secundário da existência de quem crê: é, ao invés, uma expressão íntima
e indispensável”.
Na carta, quase uma pequena “Suma” dos conteúdos essenciais da fé, o
Papa fala de Jesus que, na cruz, se manifesta “Filho de um Deus que é
amor”. Fala do perdão de Deus que “é mais forte que qualquer pecado”.
Responde à pergunta se o Deus dos cristãos perdoa os pecados de quem não
crê, explicando que “a questão, para quem não crê em Deus, está em
obedecer à própria consciência”. E, a propósito da “verdade absoluta”
contraposta às “verdades relativas e subjetivas”, dá a resposta: “Eu não
falaria, nem sequer para quem crê, de verdade “absoluta”, no sentido de
que absoluto é aquilo que é desconexo, aquilo que é privo de toda
relação. Ora, a verdade, segundo a fé cristã, é o amor de Deus por nós
em Jesus Cristo. A verdade é, portanto, uma relação”.
Joseph Ratzinger, como cardeal, tinha sido protagonista de alguns diálogos com não crentes sobre os temas da fé. Bento XVI promoveu o “Pátio dos Gentios” para que este confronto continuasse, mas durante o seu pontificado não há precedentes semelhantes à carta publicada no jornal La Repubblica. Enquanto Paulo VI e João Paulo II haviam feito diálogos sobre temas da fé tornados livros-entrevista, mas fizeram-no com grandes subscrições católicas (Jean Guitton, André Frossard, Vittorio Messori), e não com quem não crê.
A carta a Scalfari é somente a última das novidades de Francisco, um Papa que, surpreendido pela
Joseph Ratzinger, como cardeal, tinha sido protagonista de alguns diálogos com não crentes sobre os temas da fé. Bento XVI promoveu o “Pátio dos Gentios” para que este confronto continuasse, mas durante o seu pontificado não há precedentes semelhantes à carta publicada no jornal La Repubblica. Enquanto Paulo VI e João Paulo II haviam feito diálogos sobre temas da fé tornados livros-entrevista, mas fizeram-no com grandes subscrições católicas (Jean Guitton, André Frossard, Vittorio Messori), e não com quem não crê.
A carta a Scalfari é somente a última das novidades de Francisco, um Papa que, surpreendido pela
celeuma suscitada pela bagagem de mão
por ele pessoalmente levada ao avião no Rio, havia comentado: “É
preciso ser normal”. É a “normalidade” excepcional para um Pontífice, de
recusar a escolta e de mover-se por Roma ou por outra parte do mundo
sem os grandes e luxuosos automóveis de representação, acabando por
utilizar utilitários muito mais modestos do que aqueles dos cardeais no
cortejo. È sua decisão de habitar na Casa Santa Marta,
numa residência menor e principalmente menos isolada do que o
apartamento no palácio apostólico, fazendo as refeições na sala de
jantar comum. Há também os telefonemas, feitos diretamente e sem nenhum
filtro, também a pessoas desconhecidas que lhe escreveram assinalando
situações de sofrimento da mãe que decidiu não abortar ou aquela que, ao
invés, perdera o filho num assalto.
Pequenas e grandes escolhas de estilo, novas para um Papa. Falam de
um pastor que por vinte anos foi o bispo no meio do povo, para o povo e
com o povo, fora dos palácios curiais, longe de todo clericalismo e
longe do poder, continuando a ser ele mesmo até o fundo, também no
Vaticano.
O Papa que, aparecendo logo após a eleição, antes de abençoar o povo,
baixou a cabeça pedindo aos fiéis que orassem por ele em silêncio, está
agora atingindo muitíssimas pessoas: homens e mulheres, também
distantes da Igreja, escutando as homilias cotidianas da missa em Santa Marta
e olhando com simpatia o Papa “pároco”, capaz de “esmiuçar” o
Evangelho, repetindo com particular insistência a mensagem da
misericórdia. É a ternura de um Deus que ama e acolhe, junto à
prioridade evangélica do abraçar os pobres e os sofredores para tocar “a
carne de Cristo”. Sua força comunicativa deriva do fato de ser um
testemunho imediato e crível.
“É um Papa que verdadeiramente faz sentir Deus próximos aos últimos e
aos necessitados”, disse sorrindo uma garota africana saindo
terça-feira passada do Centro Astalli dos jesuítas, onde Francisco
havia recém encontrado um grupo de refugiados. Um Papa plenamente à
vontade nas favelas do Rio, nas mesas dos pobres, no abraço com os
enfermos na Praça São Pedro, como no diálogo com Eugenio Scalfari.
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